O Brasil é um país que possui mais de 800 mil presos em suas instituições prisionais. Em algum momento eles irão retornar à sociedade, seja por meio do cumprimento da pena, seja por meio de sua progressão de regime, com uma ressocialização controlada e monitorada pelo Poder Público. A saidinha, quando autorizada por profissionais da área psicológica, assistência social e jurídica, serve para reinserir o condenado de forma paulatina na vida social. Assim, num primeiro momento a proibição da saidinha traz mais malefício que benefícios.
Não adianta fechar os olhos ou fingir que não existe o problema do encarceramento. A legislação prevê pena em regime fechado para diversos crimes e seu cumprimento deve ser realizado em instituições preparadas para receber os condenados em definitivo por esses crimes.
Quando se inicia o cumprimento da pena, não se trata mais de prevenção de crimes ou medidas de segurança pública, mas sim de buscar a reinserção do condenado na sociedade, independente do que ele tenha feito. A partir deste momento, goste ou não, o trabalho é gerar oportunidade para o encarcerado retornar ao convívio social, e, uma das formas mais óbvias de o fazer é permitir o acesso e convívio com a família, principalmente, quando muito dos encarcerados, não possui qualquer vínculo familiar, portanto, quando os tem, melhor incentivar a relação.
No cenário jurídico brasileiro, a recente derrubada do veto presidencial pelo Congresso Nacional sobre a “saidinha” de presos gerou um debate acalorado sobre segurança pública e ressocialização. A Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), que regula a execução das penas privativas de liberdade, foi novamente colocada sob os holofotes, especialmente no tocante ao benefício da saída temporária, popularmente conhecido como “saidinha”.
Contexto Histórico e Jurídico
A saída temporária é um instituto previsto na Lei de Execução Penal, especificamente nos artigos 122 a 125. Este benefício permite que presos do regime semiaberto possam deixar a prisão por um período determinado para visitas à família, estudo, trabalho ou tratamento médico. O objetivo inicial era promover a ressocialização dos apenados, permitindo um gradual retorno à sociedade.
Importante salientar que para a concessão do benefício o apenado deve apresentar condições de começar a participar da vida em sociedade. Além disso, será monitorado, seja eletronicamente ou por outro meio previsto na legislação. Logo, é um benefício que precisa ser conquistado, se algum dos requisitos não for cumprido, não será concedido.
O Veto Presidencial e Sua Derrubada
Recentemente, uma proposta de mudança na concessão das saídas temporárias foi submetida ao Congresso e aprovada a nova lei 14843/2024 com vetos pelo Presidente da República, argumentando que a saída temporária poderia comprometer a dinâmica da execução penal. No entanto, o Congresso Nacional, em uma decisão controversa, derrubou o veto presidencial, suscitando preocupações sobre as implicações dessa medida para a sociedade.
O Congresso Nacional restringiu as hipóteses de concessão da saída temporária, o que pode acarretar desincentivo ao bom comportamento dos apenados, bem como uma liberação, para a sociedade sem a garantia de uma melhora na prisão.
As Novas Diretrizes para a Concessão da Saída Temporária
Com a derrubada do veto, novas regras foram estabelecidas para a concessão das saídas temporárias, delineando claramente as hipóteses em que esse benefício poderá ou não ser concedido.
Quando a Saída Temporária Não Será Concedida
A Lei de Execução Penal, com as alterações recentes, estabelece que a saída temporária não será concedida nas seguintes situações:
Crimes Hediondos e Equivalentes: Presos condenados por crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo não terão direito à saída temporária.
Reincidentes Específicos: Reincidentes em crimes dolosos que resultaram em morte não poderão usufruir da saída temporária, evidenciando uma postura mais rígida com relação a crimes de maior gravidade.
Comportamento Carcerário: Presos que não apresentarem bom comportamento carcerário, conforme avaliação periódica, também estarão excluídos do benefício.
Hipóteses em que a Saída Temporária Será Concedida
Por outro lado, a saída temporária poderá ser concedida em situações específicas, conforme os critérios detalhados na Lei de Execução Penal:
Visita à Família: A saída temporária será permitida para visitas à família em datas específicas, como Natal, Ano Novo, Páscoa, Dia das Mães e Dia dos Pais. Esta medida visa fortalecer os vínculos familiares, essenciais para a reintegração social do preso.
Educação e Trabalho: Os presos que estiverem participando de cursos supletivos, de formação profissional ou de ensino superior poderão obter a saída temporária para frequentar essas atividades educacionais. Da mesma forma, aqueles que possuem trabalho externo autorizado terão direito ao benefício, desde que comprovem a necessidade de ausência para o desempenho de suas funções laborais.
Tratamento Médico: Quando necessário, a saída temporária será concedida para tratamento médico que não possa ser realizado no estabelecimento penal, garantindo o direito à saúde dos apenados.
Participação em Funerais: Em casos de falecimento de cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão, o preso poderá obter a saída temporária para participar das cerimônias fúnebres, proporcionando um momento de despedida e apoio emocional.
Para quem a Lei é Aplicável
Uma questão que será objeto de muita discussão será se a Lei e a proibição das saidinha se aplica para os que estão presos ou para os que iniciarem o seu cumprimento após a publicação.
Como se trata de uma lei menos benéfica, é necessário que sua aplicação seja para aqueles que iniciem o cumprimento após a sua publicação e assim foi decidido em um habeas corpus proferido pelo Ministro André Mendonça.
Conclusão
A derrubada do veto presidencial sobre a “saidinha” de presos pelo Congresso Nacional é uma decisão que suscita grandes preocupações. As novas diretrizes, embora tentem equilibrar a necessidade de segurança com a ressocialização dos apenados, podem acabar resultando em um aumento da criminalidade e na sensação de insegurança entre os cidadãos.
É essencial que essas normas sejam aplicadas com o máximo rigor e transparência, garantindo que o benefício da saída temporária seja concedido apenas em casos que realmente justifiquem a medida e que não coloquem em risco a segurança pública.
A decisão do Congresso Nacional deve ser vista com cautela, e o debate sobre políticas penais e penitenciárias no Brasil deve ser aprofundado, sempre com foco na proteção da sociedade e na promoção de um sistema de justiça mais seguro e eficaz.
Especialistas em segurança pública e direito penal defendem que a ressocialização é um processo complexo, que deve ser conduzido dentro de parâmetros claros e seguros, evitando-se a concessão indiscriminada de benefícios que podem comprometer a paz e a ordem social. O desafio agora é monitorar de perto os impactos dessa decisão e trabalhar para que o sistema penitenciário brasileiro possa evoluir de maneira equilibrada, garantindo justiça e segurança para todos.